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'I need ticket': como funciona o mercado paralelo de ingressos durante a Copa

  • Foto do escritor: Reginaldo De Souza Dias
    Reginaldo De Souza Dias
  • 5 de jul. de 2018
  • 4 min de leitura

Vale a pena vir para a Copa do Mundo na Rússia sem ingresso. A reportagem acompanhou torcedores no verdadeiro mercado paralelo que acontece antes das partidas desde a primeira fase da competição. E constatou que é possível chegar ao estádio e levar apenas 30 minutos para encontrar uma entrada para um jogo que você não comprou previamente no site da Fifa. Para isso, no entanto, é necessário uma estratégia. Que passa basicamente pela forma de expressar o interesse nas mensagens ao público: "I need ticket" é a frase correta para evitar ser confundido com um cambista. Os torcedores que vendem entradas para os jogos também se espalham por todos os estádios, mas as mensagens causam certa desconfiança e os preços assustam.

Em São Petersburgo, base para o levantamento, a saída do metrô se transformou em um mercado a céu aberto para essa oferta e demanda. Desde os jogos da primeira fase, o mercado se aquece antes dos jogadores em campo. Ainda nas estações, é possível ver torcedores erguendo as placas com o que estão precisando. Antes de Brasil e Costa Rica, um grupo de Niterói precisava de dois ingressos para o jogo com a Sérvia, em Moscou. Com experiência vivida nas Olimpíadas de Londres, ergueram o papelão com a frase mágica e em trinta minutos circulando no entorno do estádio Krestovsky conseguiram os bilhetes por R$ 300 dólares cada. Questionados se era tranquilo chegar sem ingresso e tentar a sorte, confirmaram e explicaram a estratégia.

- Na rua você tem mais chance, tem que ser em inglês, em russo nem sei como escreve. A gente quer dois ingressos para Brasil e Sérvia. Tá tudo comprado para Moscou, só falta ingresso. A gente comprou as oitavas para Samara, se não passar teria que mudar a logística. E aí tem que trocar quem achou que vai vir para cá em segundo lugar, de outros países - detalhou Rafael Guimarães, dando a dica sobre o termo certo a ser usado para não gerar desconfiança.

- A gente tem que escrever "need" (preciso), se falar que vai comprar a polícia vem em cima, como foi em Londres. Tomamos dura no vôlei de praia, falaram que era cambismo. Expliquei que a gente queria comprar, não vender. Alguém vai ter um ingresso sobrando. Estou disposto a pagar até 400 dólares - avisou o brasileiro, que no fim pagou 300.

Com uma folha escrito "I sell final ticket" (Vendo ingresso para final) colada na mochila, o alemão Guenter Stiebig estava vendendo o ingresso para a final por mil euros antes do jogo entre Suécia e Suíça em São Petersburgo, local que receberia a Alemanha se ela não fosse eliminada. Presente em várias Copas do Mundo, inclusive no Brasil, o torcedor foi abordado duas vezes em cinco minutos durante a conversa com a reportagem. A ideia era simples. Já que seu time não ia mais para a final, ia ganhar dinheiro e recuperar boa parte do investimento nos jogos que foi na primeira fase.

- Comprei para a final achando que a Alemanha poderia chegar, e falhamos. Amanhã eu vou para casa, mas se não tiver vendido o ingresso posso voltar para ver a final em Moscou. Independente do time. Espero que esteja o Brasil - torcia o algoz do 7 a 1.

A alguns metros dali, outro torcedor vendia o ingresso que seria do filho, que não chegara a tempo. A placa dizia "Ticket for the match" apenas. Desta vez, sem a preocupação com as palavras, este foi repreendido por uma dupla de policiais que acompanhava a movimentação. Explicou a situação mas foi convidado a ir em direção ao setor de ingressos da Fifa. Uma senhora e sua filha que vendiam entradas no mesmo lugar escreveram "Selling Tickets" na folha. Conseguiram negociar com um rapaz rapidamente sem serem incomodadas.

Vale lembrar que na Copa do Mundo no Brasil, em 2014, onde houve um escândalo de venda de ingressos por parte de um grupo liderado pelo argelino Mohamadou Lamine Fofana, preso e solto pouco tempo depois. Além do cambismo com entradas de patrocinadores, havia ainda a busca por ingressos na internet. No site da Fifa, a procura era facilitava por um aplicativo, chamado Scorpion, que avisava quando o site disponibilizava mais entradas. Na Rússia, os relatos são de que não há mais bilhetes disponíveis online, nem formas semelhantes de monitorá-los. Desta forma, o mercado paralelo é presencial. A demanda não parece tão exagerada ainda se considerarmos que em alguns estádios e jogos há alguns lugares vazios, apesar da fase de mata-mata já ter começado.

A Fifa informou que não teve relatos de venda de ingressos falsos até agora nas arenas da Copa da Rússia. E reforçou que a compra de bilhetes deve acontecer em seu ambiente virtual, apenas. Portanto, não é permitido que um torcedor compre o ingresso do outro na porta do estádio, seja com preço igual ou maior que o oferecido inicialmente no sistema. A questão é que, conforme a Copa passa, o interesse por alguns jogos aumenta e para outros diminui.

"Para entrar no jogo é necessário um ingresso válido e um Fan ID", reforça a entidade, em resposta à reportagem. "Ingressos comprados e distribuídos por canais não autorizados serão cancelados quando identificados. A Fifa se reserva ao direito de recusar a entrada de qualquer um que portar ingressos desse tipo", completou, em nota por email.

No site da Fifa, há o tradicional espaço para quem desistir de usar o ingresso colocá-lo disponível para outro comprar. Na prática, a maioria tenta ganhar com um ágio em cima. Uma dupla de argelinos relatou que chegaram a cobrar mil euros para um jogo de primeira fase.

A Fifa informou ainda que trata o assunto com seriedade, em cooperação com autoridades russas, como de direito do consumidor também de outros países. O objetivo é exatamente identificar quem faz a comercialização paralela na internet. Mas isso recai normalmente sobre sites de venda e redes sociais. Diversas ofertas em sites foram tiradas do ar recentemente.

No começo de junho, a entidade apresentou uma queixa criminal contra a Viagogo, que vendia ingressos de forma irregular. Com suporte da organização, a Rússia possui um código do consumidor que fiscaliza a prática de ágio e tenta punir como crime os ganhos de até 30 vezes o valor de face dos ingressos, segundo a Fifa. A organização entende que essa criminalização e fiscalização das autoridades locais ajudou a minimizar a prática de cambismo e venda ilegal das entradas na Copa do Mundo. Mesmo assim a torcida dá um jeitinho.


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